Após rebeliões, governo não repassa R$ 700 milhões prometidos para presídios

Após as rebeliões em presídios no início do ano, que demonstraram mais uma vez a situação precária do sistema penitenciário no país, o governo repassou R$ 1,1 bilhão para a área. No entanto, a promessa de repassar outros R$ 700 milhões no primeiro semestre deste ano ainda não foi cumprida.

Levantamento da Contas Abertas mostra que os R$ 2,4 bilhões ainda estão “parados”, lançados como “disponibilidades” do Fundo Penitenciário Nacional (Funpen), para a construção, reforma e ampliação de presídios.

Há anos os recursos do Fundo, constituído na década de 90, não são plenamente aplicados. Dessa forma, o saldo contábil do Fundo cresceu sistematicamente. Para se ter ideia, em 2000 o saldo disponível e não aplicado atingia apenas R$ 175,2 milhões. No ano passado, as disponibilidades chegaram a atingir R$ 3,8 bilhões.

O Ministério da Justiça afirmou que o Departamento Penitenciário Nacional (Depen) aguarda aprovação pelo Congresso da proposta de aumento do limite de recursos na Lei Orçamentária Anual (LOA) para fazer novo repasse do Funpen ao sistema penitenciário dos estados.

O Funpen foi instituído pela Lei Complementar nº 79, de 7 de janeiro de 1994, com a finalidade de proporcionar recursos e meios para financiar e apoiar as atividades e programas de modernização e aprimoramento do Sistema Penitenciário Brasileiro. O Fundo é coordenado pelo Ministério da Justiça (MJ).

Enquanto os recursos não saem, a situação piora. Em palestra na Escola de Magistratura do Estado do Rio de Janeiro (Emerj), ontem (19), a presidente do Supremo Tribunal Federal, ministra Cármen Lúcia, afirmou que a situação do sistema penitenciário brasileiro é de "uma gravidade desoladora".

"São 650 mil pessoas sem liberdade, mas também sem identificação clara. Não se aboleta nem bichos do jeito que eu tenho visto", afirmou Cármen Lúcia.

Para o Conselho Nacional de Justiça, rebeliões mostram necessidade de mais fiscalização nos presídios. O Conselho mantém Grupos de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário (GMFs), que realizam mutirões de esforço concentrado para a liberação de presos provisórios, monitoram as audiências de custódia e garantem maior controle da produção dos magistrados.

Superlotação

A superlotação é um dos problemas dos presídios no Brasil. Dados de 2014 do Departamento Penitenciário Nacional (Depen) mostram o crescimento gradual da população carcerária no Brasil. Em 2004, o país tinha 336 mil presos.

Dez anos depois, esse número quase dobrou, com 622 mil, sendo 584,7 mil em prisões estaduais, 37,4 mil em carceragens de delegacias e 397 nas quatro prisões federais em funcionamento no país. A quantidade de vagas, porém, não acompanha o crescimento. Em 2014, o número de vagas era 371,8 mil.

No Amazonas, por exemplo, 62,64% dos presos são provisórios. O número de presos ainda sem julgamento (5,5 mil) supera o número de vagas no estado (3,4 mil). Na Bahia, Ceará, Maranhão, Pernambuco, Rondônia e Sergipe o cenário é o mesmo: não existe cadeia suficiente nem para os presos provisórios. Presídios superlotados do Amazonas e de Rondônia têm protagonizado as páginas de jornais desde o fim de 2016, com mortes e guerras entre facções criminosas.

Rebeliões

O ano de 2017 começou com o novo capítulo de uma antiga história. A morte de mais de 100 detentos chamou atenção para a guerra de facções criminosas dentro de presídios brasileiros e expôs a fragilidade do sistema penitenciário nacional.

Três episódios que aconteceram em 2017 denotam a crise nos presídios brasileiros. No dia 1º de janeiro, pelo menos 60 presos que cumpriam em Manaus (AM) foram mortos durante a rebelião que durou 17 horas. Na mesma semana, houve um tumulto em uma penitenciária em Roraima, onde 33 presos foram mortos. No dia 14, Rio Grande do Norte, pelo menos 26 presos foram mortos em rebelião na Penitenciária Estadual de Alcaçuz.

Após o ocorrido, cerca de 220 presos foram transferidos para outras penitenciárias. Estados como Minas Gerais, Santa Catarina e Paraná também enfrentaram esse tipo de problema. No dia 24 de janeiro, mais de 200 detentos fugiram do Instituto Penal Agrícola em Bauru (SP).


Publicada em : 20/06/2017

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